Hoje não há alegria, apenas silêncio em toda a cidade dos príncipes que em 12 de janeiro pareceu afundar em um apocalipse de dor e poeira. Em cada casa uma sepultura e em cada rosto uma urgência imprescindível.
A tragédia mostrou sua face no pequeno país que é a imagem mais cabal do abandono e do medo.
A vida no Haiti é precária, por isso foi sempre imperioso vivê-la com a maior intensidade possível, por que ela tende a ser curta e dolorosa, porém mesmo a um povo acostumado a tragédia, a calamidade que mostrou sua face escarninha de hiena quando a terra tremeu na terça-feira passada, foi tão intensa que fez com que as palavras perdessem a faculdade de comunicar.
Nunca o silêncio foi tão eloqüente. Pois, já não se ouviam nem gritos, mas apenas a lágrima salgada que corria pelas faces negras de um povo que como zumbis caminhava e ainda caminha sem rumo e sem esperança, buscando o alimento do dia para apenas sobreviver como uma fera qualquer.
Porém o sussurro, não é mais que isso, o sussurro dos emparedados é um pedido de compaixão que desperta a humanidade de muitos desses homens e mulheres brutalizados pela miséria e pela dor.
Urge enterrar os mortos. Urge livrar os emparedados das suas tumbas de cimento. Urge refazer a cidade. Mas para que? Pois os deuses todos morreram, já não escutam as batidas do tambor e nada aplaca a fúria dos ventos, o mal-estar da terra e a ganância dos homens.
Assim, é preciso reinventar o mundo e a humanidade nas tuas favelas onde os homens são irmãos dos porcos, no palácio presidencial onde o próprio primeiro mandatário é apenas mais um pedinte a esmolar piedade e compaixão ao resto do mundo.
Sim, é preciso reinventar o mundo como fizeram os escravos que deram origem ao país e que foram os primeiros a derrotar as tropas do corso, é preciso criar um futuro para as crianças que vagam sozinhas e famintas sem entender como os seus pais sumiram e que, em pouco tempo, antes de sentirem a vida vão entender a dolorosa certeza da morte.
E aos que viram o rosto para as imagens de morte, ou de vida renitente, que brota do concreto como aqueles impossíveis brotos de plantas delicadas que de alguma forma quebram as calçadas e crescem. Para aqueles que não suportam a verdade que os informantes do inferno nos enviam por satélite, com alguma abjeta vaidade, resta dizer que a verdade é que a vida é frágil como uma criança que acaba de nascer e que quando tudo escurece talvez a única coisa que sirva de conforto seja a lembrança do bem, feito sem esperar nada em troca, a felicidade de se sentir apenas mais uma gota de chuva nessa agitação tão fugaz e insensata que é a vida. A certeza de ter feito a sua parte, mesmo que ínfima, de ter combatido o bom combate.
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