terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Entrevista com José de Alencar

V.Sa se considera o maior escritor do Brasil?

- Sempre fui e ainda sou um peão na literatura, como em tudo o mais; não tenho brasões.

Qual é o seu público?

- O pequeno grupo daqueles que não carecem do hissope para serem católicos, nem do avental para servirem a causa da liberdade e da civilização.

Qual a sua opinião sobre a maçonaria?

- Uma puerilidade de homens barbados.

Como o V.Sa caracteriza o governo?

- O mago que muitas vezes faz da mentira a verdade.

Qual o grande mal do nosso império?

- Os ministros constitucionais, que a todo instante invocam o pretexto da necessidade pública e do bem geral para calcar a lei, a justiça, a moral. Outrora derramava-se mais sangue; nos tempos modernos corre mais o dinheiro; no fundo a tática é a mesma.

Quem são os heróis?

Os grandes criminosos da história.

Qual sua opinião acerca da questão servil?

- Nem nos meus discursos, nem nos meus escritos aplaudi a escravidão; respeitando-a, como lei do país, manifestei-me sempre em favor de sua extinção espontânea e natural, que devia resultar da revolução dos costumes, por mim assinalada.
A escravidão é um fato de que todos nós brasileiros assumimos a responsabilidade, pois somos cúmplices nele como cidadãos do Império.

Quem são os grandes inimigos do Brasil?

Certos escritores empenhados em desnacionalizar seu país, e para os quais a pátria não é senão o Estado com seus parlamentos, seus códigos e outros acessórios.

O quê representa o Brasil?

(Risonho)
- O caju tem mais de brasileiro do que o café e o fumo, que ornam o nosso escudo nacional.

Diga-nos alguma palavra sobre o futuro do Brasil?
- O futuro deste grande Império há de ser feito por uma civilização generosa, não pelo acinte e a inveja.

O quê nos diz sobre os seus críticos?

- Ora, sou acusado de barbarizar a nossa literatura, tornando-a tupi e selvagem, separando-a do mundo civilizado pela linha negra da escravidão; criando um teatro como nunca existiu; ora, não tenho a menor originalidade, e sou apenas o tradutor dos livros europeus.

V.Sa travou uma polêmica com o Sr. Joaquim Nabuco, qual sua opinião a respeito dele?

(Irônico)
- É uma felicidade para o mundo que até agora não tivesse muitos Joaquins Nabucos. Todo o esforço da natureza em seis mil anos não conseguiu produzir senão um modelo único. Deus amerceou-se de nós, pois do contrário; Homero, Ésquilo, Virgílio, Dante, Shakespeare, Goethe, todos os grandes poetas seriam impossíveis.

V.Sa poderia traçar um paralelo entre a literatura e o jornalismo?

- Não se lê muito entre nós; mas a opinião do jornalismo é acatada.

Para V.Sa o quê é o teatro?

- O teatro não é uma iluminação, uma fantasmagoria, ou uma destas festas venezianas de fogos de artifício e surpresas deslumbrantes. Aí os principais espectadores são o espírito e o coração; e não os olhos e os ouvidos.

O quê é a poesia?

- A poesia, como todas as coisas divinas, não se define; uma palavra a exprime, porém mil não bastam para explicá-la.

E a simplicidade?

- De há muito tempo que se usa dizer que uma mulher é simpática, para não dizer que é feia; que uma coisa é singela, para não dizer que é monótona; que um escritor é simples para não dizer que é árido.

O quê colocaria no seu epitáfio?

- Exerci meu direito, e usei da liberdade para mim muito preciosa de dizer a verdade aos reis, como aos povos.

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